24 de dezembro de 2008

ARCANOS NA PINTURA MUNDIAL II

Continuo agora com as associações entre os arcanos maiores e as mais importantes telas da história da Arte eleitas pela revista BRAVO! Especial 100 Obras da Pintura Mundial, publicada pela editora Abril. Se você chegou agora no Café Tarot e não viu a primeira parte da galeria, desça até a postagem anterior. No final desta, lanço os devidos créditos bibliográficos. Então, mãos à(s) obra(s).
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O PESADELO Henry Fuseli
O PENDURADO
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Aclamada e considerada por Goethe a obra que motivou a consagração artística do pintor e literato suíco Henry Fuseli, O Pesadelo esbanja obscuridade e traduz, pelo macabro, a atmosfera conflituosa e complexa da psique humana - a imaginação, o sonho, a visão turva da realidade pelo inconsciente. Eis a expressão quase corporal do arcano 12, O Pendurado. Se assemelham pela postura desconfortável de um aprisionamento, seja ele onírico ou real.
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O TRIUNFO DA MORTE Pieter Brueghel
A MORTE
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Tendo por inspiração a "dança da morte", manifestações dramáticas que tratavam dos castigos do mundo como a peste negra na Europa, por exemplo, a tela de Brueghel ilustra os episódios de uma chacina causada por esqueletos que, além de plebeus, esquartejam e judiam de reis, nobres e cristãos. Metáfora mais que nítida do "arcano sem nome" do fim garantido para todos os homens, independente de sua classe ou função social. Penso até que a carta pode ser um quadro resumido que sugere toda a coreografia e devastação da inominável. Se na obra temos os tons rubros evocando os campos infernais, a sangria usada pelo ilustrador espanhol Luis Royo no Labyrinth Tarot também dá essa idéia. Não só em tons mas em significado as pinturas dialogam. Osso por osso.
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NO SALÃO DA RUE DES MOULINS Toulouse-Lautrec
A TEMPERANÇA
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As analogias aqui parecem absurdas num primeiro momento. Porém, analisando mais de perto a expressão boêmia do francês Lautrec em retratar prostitutas afeta os atributos da Temperança no que diz respeito ao tédio, à rotina e aos movimentos ensaiados de braços e pernas, todas as madrugadas. A alquimia do arcano 14 se dá na mistura de cores e impressões móveis da obra, que transcende o marasmo dos bordéis. Rosa la Rouge, a ruiva ao centro da pintura, seria a mulher que verte os jarros da decadência parisiense que consumiu o pintor - em um deles, o álcool e no outro a sífilis, fluidos letais ao seu talento. A temperança é a Arte, em todos os sentidos, tons e cheiros. A justa medida entre o belo e promíscuo: Lautrec no tarô.
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O SABÁ DAS BRUXAS Francisco de Goya
O DIABO
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Os que conhecem a Bruxaria sabem o que estão vendo. E quem não domina as Artes Negras como as feiticeiras da pintura, podem ver o harém diabólico de prazeres deturpados e oferendas de rebentos ao deus do gozo. "Aquelarre", o prado do bode, ilustra o imaginário do povo espanhol que testemunhou durante tempos a perseguição inquisitorial de bruxas e sacerdotisas do Diabo. Mais que um desejo de obter poderes sobrenaturais, Goya pincelou os ignorantes apelando aos rituais para acabar com a miséria. A pintura do Thoth Tarot é o deus dos prazeres, aquele da malícia e do poder da vontade sobre o mundo. Mais real que se pensa, os bodes conversam entre si e com seus "escravos". Maior fracasso é não acreditar neles.
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TORRE EIFFEL Robert Delaunay
A TORRE
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A Torre Eiffel, símbolo máximo de Paris, é destruída por Delaunay. A palavra de ordem aqui, clara tanto na obra quanto no baralho Morgan-Greer, é fragmentação. As estruturas metálicas se desintegram pelo sol assim como o fogo, os raios e as bravas ondas tratam de corroer o esquema interno da construção. O pintor francês é considerado o criador do "cubismo órfico", tendência que agrega uma faceta lírica às exatidões do movimento tradicional.
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A EXPULSÃO DE ADÃO E EVA DO PARAÍSO Tommaso Masaccio
A TORRE
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Não podia deixar de mostrar essa outra obra devido à semelhança gritante com os antigos baralhos minchiate. O portão do paraíso é curiosamente parecido à saída lateral das antigas lâminas da Torre. Os raios acima do casal da pintura, representação clássica da voz do Criador e o Gabriel empunhando a espada dão lugar, respectivamente, às chamas internas e ao fogo que vem do alto - representado em outros baralhos pelo tradicional raio de fogo que destrói a cúpula do edifício. O termo A Casa Deus, portanto, tem uma provavél comprovação devido ao afresco italiano de 1425.
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O NASCIMENTO DE VÊNUS Sandro Botticelli
A ESTRELA
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Êxtase pode ser, com certo exagero, a palavra que descreve a reação ao observar a mais famosa tela de Botticelli na Galleria degli Uffizi, em Florença. Falo por mim, é claro, mas não há como discordar que toda a delicadeza da tela abençoa o arcano 17, A Estrela, com o que os artistas e poetas há séculos chamam de Beleza. Se a deusa mitológica nasce das espumas do mar, o arcano, por sua vez, verte suas ânforas na água. Ambas dialogam de forma sublime pela total dependência do elemento para que possam florescer ao mundo. A carta do tarô suspira renovações, criatividade e esperança. Acaba-se o tédio da Temperança e os líquidos são despejados, assim como as vestes. Se Vênus cobre suas intimidades, Estrela despreocupa-se com elas: é como ver a verdade em sua mais pura existência. Puro êxtase.
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A NOITE ESTRELADA Vincent van Gogh
A LUA
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Van Gogh, o lunático, marca presença na galeria arcana com a cena noturna mais bela que a França já viu. O incrível é que ele teve uma relação íntima com a noite desde que se mudou para Arles, cenário que serviu de inspiração para as mais belas obras de seu acervo. Mas foi essa que semeou os traços do Expressionismo devido à sua mente perturbada - atributo da Lua do tarô, óbvio. Pintou-a durante o dia, apenas com a lembrança da noite em que passeava com o enfermeiro após ter sido internado no sanatório de Saint-Paul-de Mausole. O ambiente do arcano tonifica as semelhanças com a tela: as torres da figura tradicional do tarô, como na do Ancient Italian, dialogam diretamente com o alto cipreste da esquerda e a torre pontiaguda da igreja lá embaixo na cidade. Alguém que observava os céus e dizia "Assim como tomamos um trem para Rouen, tomamos uma estrela para chegar à morte", só pode ter influência do arcano da madrugada. Loucura. Melancolia. Lua.
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OS GIRASSÓIS Vincent van Gogh
O SOL
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Se antes era perturbadoramente noturno, agora vê a luz do arcano 19 e pinta o vaso de flores mais famoso da história da arte. A tristeza é subtraída e a luminosidade é adicionada, criando uma verdadeira alegoria da vida e da morte em miríade amarelada de metáforas. Respeitando o ciclo da natureza, a essência da tela está na necessidade da existência irradiar beleza, fazendo com que o maquinário da vida não prevaleça sobre o ser humano. E é de relações humanas que trata o arcano 19 ao mostrar duas figuras se encontrando com os olhos e se tocando em sinal de reconciliação e acordo, como no Morgan-Greer. Em ambos a vitalidade explode. As cores se combinam em harmônica efusão. Como se fosse um jardim aberto. Um campo ensolarado de girassóis movimentando a vida.
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O ENTERRO DO CONDE ORGAZ El Greco
O JULGAMENTO
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Eu sei bem que O Julgamento encena um novo começo, uma nova realidade de uma outra era, com o momento de acertar as contas, independente de quem você é. Por isso que, limitado ao que a revista me oferece, associo O Enterro ao arcano 20. Um dos argumentos mais visivelmente comprovados na comparação é que ambos retratam o terreno e o celeste. O conde se desprende do corpo físico e ascende aos céus revendo toda a sua vida pelas esvoaçantes nuvens do tempo. Nessa "sinfonia fúnebre" que é o arcano do Juízo, vemos até mesmo os santos Estêvão e Agostinho virem buscar o maior nome da cidade espanhola de Toledo, assentuando sua importância em receber o julgamento. Não se pode esquecer que o cenário tradicional da carta é um cemitério, várias vezes concebido com vários túmulos abertos para o momento crucial da existência, que eu sei (e que você também sabe) qual é.
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A DANÇA Henri Matisse
O MUNDO
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Assim que bati os olhos em Matisse, vi O Mundo. Sua tela mais famosa encerra com maestria a associação das cartas numeradas às obras de arte. Nesta, em especial, o artista engloba toda a expressão humana em uma celebração artística da poesia, da pintura, da música e da dança - as próprias verdades do tarô e o resumo conceitual do arcano 21 do tarô Rider Waite, que mostra a dançarina provida dos quatro elementos que viabilizam a existência. O solo é o horizonte da Terra, o azul a profundidade do espaço sideral e, as figuras em festa, o elo definitivo entre o chão e o céu - efetivando a relação terreno-celeste da lâmina anterior. O quadro "é a síntese de símbolo e realidade corpórea", segundo o Giulio Carlo Argan, crítico de arte. Eis a realidade cósmica de uma carta de tarô e uma tela pintada a óleo. Eis o mundo.
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O FILHO DO HOMEM René Magritte
O LOUCO
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Para alguns, O Louco é tudo no tarô. Para outros, é um mero arcano sem número e, por isso, sem lugar e importância nos jogos e nos estudos. Ainda bem que essa segunda turma é bem pequena, pois mesmo sendo o arcano sem número definido, ele é o mais enigmático símbolo em meio a tantas páginas soltas desse livro da vida. De tão louco, pelo sutil ele chega a ser surreal. Daí a deixa importantíssima para Magritte marcar presença. "O Filho do Homem", obra famosa por ser uma verdadeira incógnita, é a única tela da publicação que faz o bufão rir e espelhar semelhanças. O mais incrível é que não há nenhum significado metafórico para a maçã verde cobrir seu rosto ou estar contra um muro baixo que o separa das águas. Ele evoca o mistério, segundo a explicação do pintor. E o mistério, assim como a identidade do Louco, é irreconhecível. Basta nos atermos à imagem do Thoth Tarot, por exemplo, é cercar algum traço de racionalidade. Mesmo se houver, para quê serve? Ele é questionado, mas sempre questiona quem o observa. Sutilmente.
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No fim, cada arcano acabou tendo uma pintura que corresponde à sua natureza em algum momento. Não que sejam as únicas a espelharem o tarô, muito pelo contrário. Elas são apenas sugestões do que pode ser visto através das figuras mais misteriosas do mundo. Futilidade para alguns, a disciplina "Arte e Tarô" merece respeito e reconhecimento. É um caminho de identificação; um ingresso definitivo para desvendar as semelhanças e segredos do museu arcano. Viva a liberdade visual. É ela que amplia - caso respeitemos a estrutura simbólica do baralho - a nossa capacidade de ler o mundo. Pés no chão. Olhos em tudo.
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Novidades a caminho.
Um super Natal,
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Leo
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CRÉDITOS
Pinturas - Google Imagens www.google.com.br
Tarôs - Taroteca www.taroteca.multiply.com

9 comentários:

Anônimo disse...

The Francisco de Goya piece made me think.



Gostei.



There is much more to be known concerning the "Goat"



http://www.xeper.org/pub/gil/xp_TOC_gil_Portugues.htm



Happy Holidays, carnal brother

Anônimo disse...

Amei Leo!
eu achei a temperanca mto bem explicada, pq realmente nao tem mto haver ne? mas vc e fera! bejao e feliz natal !

Anônimo disse...

Gostei, gostei, parabéns pela interpretação das semelhanças.Deu novo viés ao que já tinha em mente das pinturas.
A melhor: o papa.

Anônimo disse...

Saudaçoes Leonardo. Eu ja voto n'O Louco como a melhor pois voce soube explicar perfeitamente bem um conceito tao deturpado duma carta de tarot com uma tela mais arcana ainda. parabens. pedro/pt

Anônimo disse...

Leo,

Através do site Personare e da sua matéria sobre como vivenciar a sua própria beleza eu cheguei ao blog e a esta interessante relação que você fez com as obras de arte! Adorei isso, cara! Congrats!!!

.: Guilherme Kamui :. disse...

Confesso que quando vi teu blog, achei que era por causa de Tarot Café. Li os 7 volumes esses tempos.
Mas ai vi teus comentários sobre o Manga. E vi que não tinha nada a ver. :D

Mas, eu estudo Wicca, e amo tarot!
Cara, achei teu blog MUITO bom!!
Mesmo!
Li quase todo ele.

Sei jogar um pouco, já que minha mãe joga a anos, então, o que sei aprendi com ela. Digamos que está no sangue.
Ganhei dela um baralho de Tarot, no natal.
Estava procurando como consagra-lo e foi ai que teu blog caiu no meu monitor.

Parabens pelos textos e postagens.

Adorei mesmo!

Abraços!

Anônimo disse...

Kra, tah barbaro! Tu eh mto foda.Parabens pelo niver e muita inspiracao pra encher nossa mente de coisas maravilhosas sempre! Bjks da Cah.

Marcelo disse...

Olá, Leonardo. Acessei seu blog através da comunidade da BRAVO! no orkut e confesso que fiquei impressionado com a sua criatividade. O tarô é um instrumento interessante, mas poucos tem a capacidade de dar uma nova roupagem para sua importância e seu estilo. Suas matérias são dignas das páginas da revista. Parabéns. Sucesso cada vez maior é sempre bom. Marcelo.

Leo Chioda disse...

Obrigado, pessoal.
Super ano 9 pra todos!
Aguardem as novidades.
Grande abraço.